The Black Angels: Pubs e Shamans

Processo de conhecimento de uma banda sensacional nos anos 90:
1 – Durante os inúmeros programas de clipes da MTV (sim, eles passavam clipes e todos separados por gênero como Yo MTV, Fúria MTV, etc.) um show em especial sempre agradava: Lado B.
2 – Lado B era apresentado pelo saudoso “Reverendo” Fábio Massari todo sábado às 23 horas. Neste programa, Massari apresentava artistas excelentes no qual você nunca havia ouvido falar.
3 – Após alguns desses artistas chamarem sua atenção, o melhor a fazer era procurar uma importadora de CDs ou pedir para algum amigo seu fora do país mandar ou trazer o CD. Nada de Napster, Pirate Bay ou Kick Ass Torrents.

Processo ATUAL de conhecimento de uma banda sensacional:
1 – Ao chegar em casa após um dia cansativo de mudança de apartamento, sento na frente do computador.
2 – Começo a preparar uma resenha para o Pipoca & Nanquim e, no YouTube, deixo rolar uns videos do White Denim enquanto escrevo.
3 – Depois de um tempo, dou uma parada no texto e vou conferir os videos relacionados. A série Sons Of Anarchy está em destaque (Hell’s Angels que traficam armas e drogas). A trilha sonora da série é decente mas ridiculamente mergulhada em testosterona.
4 – Relacionado aos videos do Sons of Anarchy, que já estavam relacionados com os videos do White Denim, vi uma banda com um nome ridiculamente clichê: Clico em The Black Angels, especificamente na música “Young Men Dead“.
5 – Meu cérebro explodiu em lisergia.

Da esquerda para a direita: ....bah...isso nem importa.

 O som neo-psicodélico do Black Angels vem do Texas (EUA). Para minha surpresa, o nome da banda vem da esquizofrênica “Black Angel’s Death Song” do Velvet Underground. The Black Angels conseguiu criar um universo sonoro hipnótico e ao mesmo tempo utilizar riffs pegajosos o suficiente para que algumas rádios mais destemidas se atrevam a passar uma de suas músicas de 7 ou 18 minutos. Quando digo pegajoso, leia-se “riffs pop como The Doors e Love faziam”. Impossível não comparar com The Doors, mesmo que infinitamente menos virtuoso.

 

Em especial o disco de estréia “Passover” foi o que mais me deixou boquiaberto: guitarras explodindo em reverbs, vocais proferidos como um instrumento, letras shamanisticas e tudo carregado por percursão simplisticamente tribal. Todos esses elementos se juntam para formar um nível de inconsciência insistente que lembra uma locomotiva sem freio e sem começo ou fim. Ou algo menos filosófico e ambicioso, como um pub escuro, sujo e fedendo a urina. E é aí que está o “gênio” da banda: misturar o ambicioso com o realista e descompromissado.

 

The Black Angels é a banda mais stoner rock que você nunca ouviu falar. São três álbuns (Passover, Directions to see a Ghost e Phosphene Dream) que honestamente não sei dizer qual é o melhor. São tão consistentes que poderiam fácil se passar pelo mesmo álbum. Apesar da procura de uma banda hoje em dia ser algo fácil e raramente compensador, The Black Angels é uma daquelas coisas raras que vem para ficar na sua coleção. Recomendado para: cervejeiros, motoqueiros, filósofos, maconheiros, lisérgicos, caminhoneiros, historiadores, blueseiros, etc.

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Gallaghers em vôo “solo”

Oasis é o famoso “ame-o ou deixe-o”. Desde o começo da década 90, a banda foi uma pedra no sapato de qualquer um que a acusasse de pegar emprestado mais do que devia dos grandes nomes do rock, isso sem negar ou se desculpar por usar melodias dessas bandas descaradamente. Juntando essa polêmica (quem não usa e abusa do que já foi “criado”?) aos altamente documentados conflitos internos entre os dois irmãos, chegamos ao típico corpo de trabalho de qualquer banda de rock n’ roll decente. Os Gallaghers chegaram com aquele drama de Keith vs. Mick mas também com o espírito de Robert & Jimmy (e a genética, claro, botando mais lenha na fogueira). Algumas bandas engolem a raiva e com paciência continuam com a carreira para o bem de seus próprios bolsos. No caso do Oasis, o ódio genético de irmão vs. irmão foi para Noel (o verdadeiro arquiteto dessa banda) o suficiente para desistir. Foi assim mesmo: Cansei, chega e tchau

Agora vem a continuação do drama: a “batalha” dos discos de carreira solo. Liam se juntou com os marionetes de Noel e criou o Beady Eye. Enquanto a trupe, agora sob o comando de Liam, aparecia em quase todos os programas de talk show americano, Noel tomou seu tempo e criou o coletivo High Flying Birds assumindo os vocais. Entrar no papel de vocalista oficial não é novidade: quando Liam resolvia dar um piti e não se apresentar, Noel carregava o set inteiro da banda sem o frontman. Com isso em mente, fica mais fácil analisar os dois discos

 High Flying Birds: para quem esperava algo mais pessoal e folk de Noel (eu mesmo esperava algo nessa linha) vai ficar surpreso com a familiaridade do álbum, até porque se trata do arquiteto-mestre do Oasis. Muitos reclamam que, para uma declaração de independência, High Flying Birds é extremamente nostálgico. Na verdade, acredito que seja a pura essência de Noel, é o que o cara ama fazer e, mais importante, é o que ele SABE fazer. Entre arranjos de cordas, coros, trompetes, etc. 80% deste ábum é direcionado para canções épicas em grandes arenas. Quando você analisa um pouco mais, vai perceber que não há nada no currículo de Noel que diga “folk introspectivo”. Quem mais hoje em dia ainda se atreve a fazer um solo absurdo de guitarra sobre de um canção orquestrada (I Wanna Live in a Dream) e ainda dar uma credibilidade invejosa para a mesma?

Mesmo com a nostalgia passeando pelas faixas de High Flying Birds, coisas intrigantes acontecem pelo repertório: músicas como “AKA… What a Life!” se apoiam em um piano crescente, bateria marcada quase à beira de um sampler eletrônico e um Noel melancólico. “If I Had a Gun…” parece uma simples canção mas, na medida em que você escuta a mesma inúmeras vezes, você percebe camadas e mais camadas de sons escondidos por debaixo dos acordes que provavelmente apenas um cachorro consegue identificar. Em “Let the Lord Shine a Light on Me” (um lado-b desse disco de estreia que vale MUITO a pena procurar), Noel começa criando um clima quase etéreo e ao mesmo tempo blueseiro enquanto a música vira uma monstruosa balada com um “solo de voz” por uma cantora (nome?) potente no melhor estilo épico do Oasis (lembram de Great Gig In The Sky do Pink Floyd?).

Fico imaginando se Noel seguisse alguma experimentação como “Setting Sun” (junto com Chemical Brothers) mas apenas “AKA.. What a Life!” dá um gostinho do que seria esse disco. Para uns, esse álbum é uma oportunidade perdida de fazer algo diferente. Para outros, mais um demonstração da genialidade de um excelente compositor de rock n’ roll. A única certeza é que, com High Flying Birds, fica claro o que todos já sabiam, Noel é o Oasis e, até a reunião dos irmãos Gallagher (claro que vai rolar), o mais velho vai navegar por águas conhecidas com pequenas fugas de rota uma aqui e outra ali (vai rolar um projeto com o grupo Amorphous Androgynous).

 Beady Eye: de certa forma, soa apenas como Oasis sem Noel (que não vê nada de errado com música moderna). Liam sempre foi o sujeito cegamente apaixonado pelos anos 60. Basta ouvir “The Roller” e perceber que a progressão dos acordes é xerocada diretamente de “All You Need Is Love”. Qual o motivo então de Different Gear, Still Speeding ter um feeling tão renovador quanto os últimos dois (e excelentes) álbuns do Oasis? Simples, esse é um Oasis onde Liam dá as cartas e o rock n’ roll está no volante com um espírito selvagem de rebelião embebedada, apesar de seguir os padrões óbvios de uma canção de rock.

Trata-se de pura diversão psicodélica no estilo dos primeiros álbuns do Oasis, e por esse motivo, provavelmente será o disco solo dos irmãos que vai agradar a um número maior de fãs. Instinto dita a regra mesmo que haja uma leve queda na qualidade das letras, o que não é nenhuma surpresa. Beady Eye é mais uma expressão de toda a vontade de extrapolar que Liam simplesmente não sentia perto de Noel. Different Gear, Still Speeding é um verdadeiro emulador de todas as fantasias sessentistas do caçula Gallagher. O destaque nesse disco, que encorpora bem o que é o Beady Eye e onde difere do Oasis, é a faixa (aham) “Beatles and Stones“. Eles copiam, mas copiam muito bem.

 Muitos fãs do Oasis não se preocuparam quando a notícia do fim do grupo circulou pela internet, no fundo todos já pensavam “Bom, agora vamos ter duas versões de Oasis pra curtir e muito mais briga!”. É exatamente isso que aconteceu: enquanto Beady Eye vai alimentar noitadas alcoólicas e acompanhar o furto de cones (ha!), o High Flying Birds vai tomar conta das suas epifanias matinais e da sua ressaca moral. O que importa é que saímos ganhando em grande estilo.

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TOOL : Ferramenta espiritual

Prelúdio do meu iluminismo:

1994 – Led Zeppelin e outras bandas setentistas sempre foram trilha sonora predominante durante os  meus 13 anos de presença nesse planeta. Mãe e Pai sempre entupindo meus ouvidos com retórica hippie-materialista. Eu regurgitava tudo para a molecada da minha rua. Sem efeito. Era mais legal brincar de carniça.

1995 – Mesmo apaixonado por Zeppelin, Doors e Floyd, alguma coisa estava faltando. Seria isso um sintoma do meu cansaço com essas bandas? Impossível. Sempre que o LPs rodavam na vitrola (funcionando 100% até hoje) era como se eu estivesse cantando “Dancing days are here again, as the summer evenings grow…” pela primeira vez. Alguma coisa estava errada.

1996 – Eu conhecia todas as lojinhas música em Brasília: Da WOM no final da Asa Sul, passando pelas discotecas bizarras do Conic até o sebinho de LPs na 216 Norte. Durante minhas caminhadas na Asa Norte, exatamente na 310, me deparei com uma loja minúscula chamada Sounds Music. Claudio era o dono. Claudio viajava mensalmente para New York e trazia os álbuns mais loucos possíveis. Durante minha aquisição de In The Wake Of Poseidon do King Crimson, Claudio me indicou uma banda. A banda era Tool. O álbum era Ænima.

1997 – Depois de um ano inteiro ouvindo NADA mais além de Tool e sua obra de arte chamada Ænima, eu percebi o que não se encaixava com as bandas setentistas que eu amo até hoje: A linguagem não era a mesma. O som não representava minha época. As letras não descreviam o estado da minha consciência. E assim, Tool se tornou o meu despertar espiritual.

Ænima

  Tool é exatamente isso: uma ferramenta para uma consciência maior. Um catalisador para o processo de “se encontrar” ou descobrir seja lá o que você precisar descobrir, um LSD em formato de ondas sonoras com efeitos colaterais 100% benéficos. Com Tool, os conceitos de Timothy Leary começaram a perambular pela minha cabeça “Always think for yourself and question authority”. É verdade, trata-se de um conceito setentista, mas sob um novo olhar, um novo ângulo. Isso tudo na cabeça de um moleque de 16 anos.

Dr. Timothy Leary

  A musicalidade de Tool se baseia muito no ritmo incomum. Tempos quebrados e inovadores que carregam letras cheias de referências espirituais, apocalípticas e lisérgicas. A honestidade em representar a feiúra do materialismo é tema recorrente em todos os discos do Tool, ao mesmo tempo em que a beleza da raça humana como um todo é exaltada.  Diferente de King Crimson, a sessão rítmica de Tool não se interessa pelo improviso, mas sim em criar uma atmosfera que segue as análises líricas até um final épico que deixa qualquer ouvinte com a sensação de ter saído de um transe denso. Poucas bandas conseguem emular uma experiência profunda que sincroniza perfeitamente os elementos letra e som.

O fato dos integrantes preservarem o anonimato garante ainda mais misticismo em cima das composições. Por exemplo, em seus shows atuais, é quase impossível enxergar os membros da banda entre as enormes telas com imagens bizarras e metafísicas. Algumas letras, como a da melódica “H.” e da exótica “Stinkfist” ainda são motivo de debate e interpretação em fóruns de fanáticos, mesmo 15 anos após o lançamento de Ænima. Mas essa é a utilidade da banda, pegue uma letra em qualquer disco, e deixe aquelas palavras lhe ajudar de acordo com sua interpretação. É difícil rotular a banda: apesar de serem mais voltadas para o peso do rock progressivo, as estruturas musicais são ricas em detalhes melódicos e efeitos (baixo, guitarra e bateria) hipnóticos. Ta ai, “hipnótico” é um termo justo para explicar Tool.

Em 2001 eu ainda morava nos EUA e esse foi o ano em que Tool lançou mais uma obra de arte: Lateralus.

Lateralus

 Lateralus é, ao mesmo tempo, o mais acessível e o mais profundo. Um CD tem 80 minutos disponíveis para gravação. Lateralus utiliza 79 minutos e 58 segundos. Não existe desperdício: cada composição e cada interlúdio têm um motivo pré-determinado. Enquanto algumas faixas se desmancham na próxima, outras são apenas introduções: “Parabol” serve de guia espiritual para “Parabola”:

This body holding me, reminding me that I am not alone,
this body makes me feel eternal.  All this pain is an illusion.”

Musicalmente falando, Lateralus conta com a mesma sonoridade complexa de ritmos oscilantes e dinâmica inovadora.  Fica aos ouvidos a faixa de 11 minutos chamada “Reflection” que conta com uma das letras mais enigmáticas da banda e um ritmo….hipnótico. Obs.: A letra começa aos 3 minutos e 42 segundos.

Se essa canção não lhe deixar no mínino intrigado e meditativo, tem algo errado com você. Ela representa muito bem o que é Tool: “Crucify your ego, before it’s far too late, then you’ll come to find that we are all one mind”

Em 2006, morando novamente em terras brasileiras, comprei o último trabalho da banda (até o momento): 10.000 Days.  Apesar do anonimato desejado, este último álbum conta com uma das canções mais pessoais já escritas pela banda, o belíssimo duo de 17 minutos “Wings for Marie” e “10.000 Days”.  Este épico é uma ode à mãe de um dos membros que, paralisada por 27 anos (quase 10.000 dias) por conta de um derrame, morreu durante as gravações deste álbum. É uma canção que evoca um sentimento voyeur, mas é proferida de maneira tão sensível que nunca atinge o melodramático. No resto, o disco conta com letras mais centradas e espirituais, com algumas referências a situações metafísicas.  Trata-se de um conjunto de faixas que trocam a antiga raiva por um sentimento mais introspectivo com cada sessão rítmica trabalhada com precisão extrema.

10.000 Days

Minha transformação de um inconseqüente em um adulto foi como a progressão temperamental desses três álbuns, como se meu envelhecimento seguisse a carreira da banda. De raiva e questionamento (Ænima) para experimentação e misticismo (Lateralus) finalmente chegando ao iluminismo espiritual e aceitação da minha mortalidade (10.000 Days).  Se o texto foi muito filosófico, me desculpem, mas é impossível analisar Tool de outra maneira. Uma banda que até hoje, já me orientou em inúmeras situações. Aguardo ansiosamente o próximo álbum e a próxima fase do meu crescimento espiritual. Meu Ajna (o terceiro olho e sexto chakra) abre-se aos poucos…

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Opeth: Homenagem à uma herança

O que acontece quando uma banda de death metal não faz mais death metal? Perdem milhões de fãs? Suposição mais do que justa. Mas a resposta correta é: Criam um álbum tão belo, delicado e complexo que exige o máximo de sua atenção para entender o que esta acontecendo nessas 10 composições. Um álbum para ouvir deitado e, de preferência, com headphones. Heritage é um clássico instantâneo.

Heavy/Death/Doom metal, não importa como você chama, é algo que nunca me agradou. Aprecio a agilidade musical de seus adeptos e entendo a importância que essas bandas têm no mundo inteiro. Tão raro quanto um eclipse solar, uma entre as zilhões de bandas desse estilo chama sua atenção. Você percebe um lirismo incomum e uma característica rítmica inigualável.  Opeth é assim, indecifrável e imprevisível. Como o próprio Mikael Arkefeldt (líder) diz: “Odeio quando, ouvindo uma canção qualquer, sei exatamente para aonde vai a melodia. Não há surpresas ou desafios para o ouvido”. Fato, nem tudo deve ser uma jornada sonora para os ouvidos. Nem tudo deve ser complexo, como por exemplo, o jazz.  Mas quando o banal é maioria, a essência do bom gosto move montanhas para descobrir algo respeitável.

Mikael Akerfedlt no centro.

É ai que Opeth entra. Desde seu primeiro álbum (Orchid, 1995), entre interlúdios acústicos clássicos e jazz virtuoso, Opeth vem deixando bem claro para aonde caminha a sonoridade da banda. Menos gritos guturais e mais vocais melódicos porque, convenhamos, Mikael consegue emular a voz de um demônio torturado e ao mesmo tempo, quando precisa, tem a voz etérea de um anjo. Menos distorção nas guitarras e mais ênfase no dedilhado acústico impecável. Uma progressão natural para uma banda que sempre expôs sua paixão pelo rock psicodélico e progressivo dos anos 70. Opeth passou de Slayer/Metallica/Morbid Angel para Beatles/King Crimson/Andres Segovia. Para mim, é como se fosse uma banda com duas carreiras sensacionais.

Heritage soa assim: Cream, King Crimson, Led Zeppelin, Beatles, Rush, Yes, Deep Purple, Camel, Gentle Giants, etc. Não é a toa que o nome do álbum é “herança”. Pianos, flautas e uma atmosfera sombria reinam grande parte de Heritage. O álbum é a ponte perfeita entre a mente esquizofrênica e a sinapse cerebral de uma epifania. Genialidade e loucura em seus respectivos ápices. Realmente não existe outra maneira de caracterizar essa obra de arte. I Feel The Dark é a composição que melhor representa o álbum e em que a voz de Mikael mais impressiona. Obs.: Já nos primeiros 2 minutos, fica claro o poder de criar paisagens sonoras dessa banda sensacional.

Camadas e mais camadas de instrumentos que às vezes, você não identifica de primeira, cortesia da produção de Steve Wilson do Porcupine Tree. As variações musicais dentro de uma mesma composição forçam os ouvintes a checar o visor do cd player para confirmar se ainda estão ouvindo a mesma faixa. E eu não esperava nada mais nada menos com Opeth. Eles já levaram o metal aonde NENHUMA outra banda conseguiu ou vai conseguir. Um momento fraco de carreira do Opeth seria o ápice musical de 99% do resto das bandas atuais no planeta (não é exagero, quem conhece sabe). Chegou a hora da evolução. Heritage inicia um novo capítulo no universo de Opeth (nome de uma cidade mitológica situada na Lua), um capítulo de essência folclórica beirando a perfeição. Música assim esta cada vez mais rara.

Fica ai a dica para quem procura música, não por gênero, mas por excelência. Heritage vai agradar quem quer algo novo e degusta música como degusta uma boa cerveja com os amigos, com prazer. Para os que gostam de ter uma trilha sonora para contemplar paisagens, a sonoridade de Heritage faz exatamente isso, cria novas histórias para paisagens já observadas. Não é um álbum fácil, mas é compensador. Disco obrigatório.

Heritage

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Sunny Day Real Estate: Monumento Inabalável

Quando o perigoso pântano de mesmice do cenário musical acessível começa a infectar seus ouvidos (até quando você não procura ouvir) com bandas cada vez mais genéricas, você começa a se lembrar de quando era um adolescente nos anos 90. O cérebro automaticamente visita o tempo em que ligar o rádio no horário certo significava ouvir Alice In Chains, Mad Season, Smashing Pumpkins, Jane’s Addiction e outras maravilhas do rock da época.

Depois de tirar o pó de alguns LPs e Cds dessas bandas e passar uma tarde inteira revivendo glórias passadas, eu fico me perguntando quando foi que tudo aquilo teve um ponto final. Não que as rádios estivessem livres de porcarias, mas não era preciso procurar muito para encontrar algo agradável. Claro que existem bandas atuais excelentes, mas aquele período capturou uma essência crua e honesta do que era uma banda de rock.  Na minha opinião, o ponto final dos anos 90 aconteceu, na verdade, em 20 de junho de 2000 quando uma banda, ainda desconhecida, lançou seu 4° e último álbum: The Rising Tide do sensacional Sunny Day Real Estate.

Esta pequena jóia representa a conquista perfeita do som cativante e épico do Sunny Day Real Estate. Assim como o título do álbum indica (A Maré Ascendente), as poderosas composições vem com força e determinação em pesos como “Killed By an Angel” e “One” e voltam para acalmar o ouvinte com baladas que perfuram o mais duro coração (Tearing In My Heart). “Television” empolga pelo simples fato de lembrar um The Police mais pesado, sem sacrificar a melodia enquanto “Fool In The Photograph” homenageia sonoridades profundas do oriente médio, emprestando uma seriedade ainda maior para as letras do gênio Jeremy Enigk:

Me and the fool in the photograph
A soul many times revealed
The scars only half concealed
I wonder how many days I’ll bleed
With the words I refuse to form
Now I will be free

Esse vídeo é um bom exemplo de como Sunny Day Real Estate era bom no que fazia e como a simplicidade de quatro caras fazendo um som é superior à popularidade enfeitada de um produto de uma grande gravadora. Sempre fico feliz quando vejo uma banda em que todos os integrantes estão entregues de corpo e alma na música que estão tocando:

A produção do álbum é impecável: arranjos de cordas e teclados são utilizados apenas para aprimorar a sonoridade honesta da banda tornando possível distinguir cada instrumento, cada backing vocal e cada peça da bateria. O vocal de Jeremy Enigk é peculiar. Um timbre de voz sofrido que encaixa apenas no universo de Sunny Day Real Estate. The Rising Tide é descaradamente volumoso, limpo e direto. Perfeições musicais como “Snibe” são motivo o suficiente para que uma banda como Sunny Day Real Estate continuasse na ativa por décadas. A faixa título é uma das melhores, misturando harmonias graciosas, vocais sinceros e um ritmo insistente que escala para um final misterioso.

Complexo e explorador sem tirar o estilo exaltado da banda, The Rising Tide é o melhor disco do Sunny Day Real Estate. Uma obra de arte que há 11 anos visita pelo menos uma vez por mês a “vitrola” aqui de casa. Pra quem conhecia já da época, sabe que esse álbum é um monumento inabalável na história do rock alternativo. Pra quem não conhece, fica ai a dica de 11 composições concebidas em pura e sincera emoção humana. Obrigatório.

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The Dandy Warhols: Lisergia Pop

Dica pré-resenha: Enquanto lê a critica, deixa o video rolando 🙂

Dandy Warhols é a cria lisérgica entre Velvet Underground e Rolling Stones. Essa descrição já deveria ser o suficiente para qualquer um respeitar essa banda. Uma pitada de Love & Rockets aqui e outra de Ride ali e temos em mãos a combinação perfeita entre pop, rock e integridade, coisa rara hoje em dia.

Já com o primeiro disco independente carregando um título pretensioso (Dandy’s Rule, Ok? 1995), o grupo nunca fez questão de esconder suas influências. Canções como “Lou Weed” e “Ride” provam isso, e também rendem um grau de honestidade à banda, diferente de muitos “artistas” que insistem na suposta originalidade. Aliás, o que há de errado em ser influenciado pelo Velvet e pelos Stones? Apesar da banda ser do estado americano de Oregon, até o terceiro álbum o grupo alcançou sucesso apenas na Europa. As gravadoras americanas não gostavam dos álbuns pois não tinham hits suficientes, o que fez com que a banda apostasse o sucesso em solo europeu.

Com o 4° disco pronto, a banda conseguiu formular um pop honesto com muita alma. Thirteen Tales From Urban Bohemia é um clássico perfeito. Mais eclético e menos “atropelado” que os três primeiros álbuns, esse é um álbum focado e trabalhado na estrutura simples das composições. Músicas como “Godless” e “Nietzsche” são épicos com mais de 5 minutos e perfeitamente acessíveis à qualquer ouvido desatento. As qualidades intangíveis das músicas do Dandy Warhols são as mesmas de qualquer canção popular da moda: mais grudentas que chiclete, vicia nos primeiros 5 segundos e fica no seu cérebro. A grande diferença aqui é a influência óbvia dos grandes nomes do rock. A atmosfera do disco tem um tom sarcástico de uma banda que esta fazendo o que quer e não se leva muito a sério. Tipo de coisa que admiro.

Já experimentou sintonizar em qualquer estação de radio hoje em dia? Muita porcaria enlatada. Claro que as rádios são, em sua maioria, veículos de tudo que é medíocre. Mas Dandy Warhols é o tipo de pop “fácil” que eu queria ouvir nas rádios. Parte disso vem das influências mas também das letras muito bem elaboradas. Um bom exemplo das letras do grupo que os distanciam de tudo que é musicalmente descartável é a faixa “Mohammed“:

Again and again
I get up and say:
I only want to get it right
I only want to do the right thing
But all these demons, harass my soul.
No one can say that they’re an island
When all this freedom you get is a lie

Como sou do tipo que analisa profundamente as letras das bandas que eu curto, canções como essa chamam minha atenção com muita facilidade. São 8 álbuns desde 1995 e cada um na direção certa com sua sonoridade acessível. A grande diferença entre Thirteen Tales Of Urban Bohemia e os outros discos é a excelente produção, ritmos hipnóticos e camada sobre camada de música excelente são o que fazem desse disco uma experiência perfeita com o headphone certo. Recomendo!

 

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Porcupine Tree: Progressividade e Peso.

Como diria Jack o Estripador, vamos por partes: Porcupine Tree foi uma piada musical de Steven Wilson. Em 1992, o multi-instrumentista resolveu criar uma banda fictícia de rock progressivo psicodélico dos anos 70 (até inventou uma biografia falsa, algo como Spinal Tap). Gravou discos super longos com músicas de 20 minutos e espalhou pelos circuitos underground de Londres.  O que ninguém esperava era a qualidade sensacional das composições. Os CDs caseiros espalhados por Londres logo viraram verdadeiras raridades. Todos queriam saber sobre a banda dos anos 70 que ninguém e nenhum crítico nunca ouviram falar.

Em certo momento, Wilson percebeu o potencial das músicas que estava criando com seus companheiros (apesar da maioria ser gravada pelo próprio, sozinho em um estúdio) e resolveu abrir o jogo sobre a pegadinha. Foram 16 álbuns de 1992 até 2010, e o cara promete continuar.

Resumindo o Porcupine Tree em apenas uma frase: A progressividade do Pink Floyd revisitada e mais pesada. Falo de consciência limpa quando digo que bandas como Tool e Porcupine Tree são o máximo que essa geração pode esperar de algo parecido com o King Crimson e Pink Floyd. O que realmente interessa, é que Wilson é um mestre em criar composições belíssimas, longas e dinâmicas de conteúdo avassalador. Guitarrista impecável e arranjador magistral, Wilson é sempre requisitado para gravações de outros artistas do mesmo seguimento. Genialidade e audácia em um só projeto.

Steven Wilson

Conectar novas tendências sonoras com algo que o Pink Floyd fez décadas atrás não é para qualquer um. Deixo as músicas do “grupo” para contar melhor sua história e seu estilo, ou ficaria escrevendo aqui por dias!

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Kasabian e seu hospício sonoro

Quando ouvi Kasabian pela primeira vez, pensei logo que se tratava de mais uma hype inglesa já que, desde o Oasis, o Reino Unido não se conformava apenas com o Arctic Monkeys como mais uma proeza. A música que não parava de tocar nos circuitos independentes era Club Foot que logo se transformou em um monstro das rádios. Bastou Noel Gallagher dizer “Fudeu…superar isso vai ser complicado” quando ouviu a canção para chamar o Kasabian para abrir os shows da turne de 2004. Exagero do Noel? Com certeza! O Oasis tem composições anos luz à frente do Kasabian, o que não tira nenhum crédito dessa banda completamente psicodélica. “Kasabian” é o sobrenome de uma das loucas seguidoras de Charles Manson que foram responsáveis pelo assassinato de Sharon Tate. A banda disse que gostou da sonoridade da palavra. Então tá…

Depois que Club Foot cansou os ouvidos de muitos, canções menos audaciosas do Kasabian começaram a circular nos mais diversos sites de rádios online. Algumas músicas em específico me fizeram pensar: “Putz, Stone Roses ressuscitou!“. Como sempre fui fã incondicional do Stone Roses, que soube muito bem misturar o rock psicodélico com um dedo no eletrônico, decidi conhecer mais o Kasabian. Para minha completa surpresa, o disco de estreia homônimo é sensacional e vai a fundo camadas e mais camadas de qualidade além do single Club Foot. O disco inteiro parece mais uma colagem de ideias inusitadas de acordes e samplers esquisitos e minimalistas que, apesar dessa descrição nada animadora, funcionam muito bem. Algo que só duas mentes completamente submersas em cerveja (e ocasionalmente um papelote de LSD) conseguiriam tornar possível. Todas as composições (letras e músicas) são creditadas ao vocalista Tom Meighan e ao DJ multi-instrumentista Sergio Pizzorno. Poucas bandas conseguem, ao mesmo tempo, entender o que significa fazer plateias dançar e bater cabeça e criar músicas íntegras com muita alma e algum nível de originalidade.

As canções do primeiro álbum conseguem ser íntimas e épicas (um feito raro atualmente), parecem sair de uma torcida de futebol e terminam a jornada em uma viagem psicotrópica. Entre canções instigadoras e interlúdios chapantes, as músicas do Kasabian são entrelaçadas em tantos detalhes sonoros que a cada rodada você percebe algo novo. Sem deixar a bola cair, a banda conseguiu manter a qualidade nos próximos 2 álbuns: Empire consegue uma cria entre Chemical Brothers e Rolling Stones e West Ryder Pauper Lunatic Asylum mistura eletrônica e baladas acústicas com filmes de horror. Loucuras à parte, Kasabian mantém a veia do rock pulsando freneticamente enquanto a psicodelia das letras intoxicam a criatividade de qualquer ouvinte, criando cenas absurdas e melodias inspiradoras. Com letras como “John was a scientist, he was hooked on LSD / Interested in mind control and how the monkey held the key / Said that ‘all life is experiments somebody’s planning for the heir’ / It’s for the unexpected citizens who hallucinate in fear” não dá pra errar!

Já me pediram para definir o Kasabian em uma palavra: O melhor que consegui foi “Loucura”. Como diria David Byrne: “STOP MAKING SENSE!”. Essa parece ser a proposta. Nada mais apropriado para um grupo de ingleses alcoólatras viciados em futebol e LSD, que não respondem pelos seus atos (e nem se explicam) e gravam seus álbuns em fazendas de porcos. Kasabian dificilmente vai lançar algo que agrada só um tipo de plateia. Assim como o temperamento oscilante das canções, os caras estão destinados à evolução constante.

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Descobrindo Midlake…

Em 2000, cinco estudantes de jazz clássico da Escola de Música do Texas se juntaram para uma jam session despretensiosa quando perceberam que, sem tentar demais, o som que emanava dos amplificadores era um pouco mais ousado e setentista do que o esperado. Mais surpreso ainda ficaram quando Tim Smith (guitarra, vocal e teclado) começou a recitar poemas de acordo com a sonoridade que ali estava sendo criada. Impressionados com o resultado, começaram a tocar em bares e coffe shops do Texas e assim nasceu o Midlake. Nem precisa contar o resto da história. Se não fosse meu amigo Cássio, nunca teria ouvido falar dessa banda. Antes tarde do que nunca….

Midlake

O Midlake é o que eu chamaria uma cria perfeita entre Neil Young e o America (A Horse With No Name lembra?). Melhor do que copiar o estilo folk dos trovadores dos anos 70 e jogar guitarras clássicas em cima dos violões, o quinteto preferiu ser influenciado pelos instintos da primeira jam, mesmo que a essência da criação não permaneça em apenas um rótulo. Para explicar melhor, o Midlake produziu um dos discos de folk rock progressivo mais impressionantes da década dos anos 70 que não foi feito na época, sacou? The Trials of Van Occupanther é tão excelente em suas composições (tanto as letras quanto as músicas) que se tornou um dos meus top 10 álbuns.

 O interessante é que, como cada um dos integrantes são formados em Jazz e tem conhecimento de escalas complicadíssimas e das melodias mais complexas, decidiram fazer um som que não chega a ser minimalista, mas sincero e, por falta de uma expressão mais adequada, humano. Smith tem o tipo de voz que invoca gênios como Jeff Buckley e Rufus Wainwright, mas sem forçar demais, mantendo a sutileza de uma experiência íntima com o disco. A muito tempo não ouço uma voz tão honesta e melancólica que em parceria com Eric Pulido (também guitarra, vocal e teclado), soa tão bem quanto os instrumentos. Um belo exemplo dessa harmonia vocal é “Roscoe” (o clip revela bem o espírito da banda):

 

Esse é o tipo de disco que se coloca para ouvir em uma roadtrip, daquelas que todos deveriam fazer pelo menos uma vez na vida enquanto as letras de The Trials of Van Occupanther revelam e identificam faces da consciência humana. Mais uma banda que vou ficar sempre de olho para futuras perfeições sonoras como essa. Valeu Cássio!

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The Last Shadow Puppets e o fator Scott Walker

The Age of Understatement é inspirado nas composições sensacionais de Scott Walker com uma sonoridade mais ácida pesando para o lado de David Bowie. Alex Turner (Arctic Monkeys) e Miles Kane (The Rascals )começaram a compor várias canções nos bastidores da turnê que as duas bandas fizeram juntas em 2007 e, satisfeitos com os resultados da brincadeira, resolveram ir à Franca e gravar essas pequenas composições. Para dar um ar mais clássico nas faixas previamente baseadas em violão e voz, foi contratada a Orquestra Metropolitana de Londres (é aqui que entra toda a influencia dos discos do Scott Walker) que foi decisiva em transformar este disco em um pequeno tesouro.

 The Last Shadow Puppets é um projeto bem mais ambicioso que as bandas principais dos dois músicos. Com muita qualidade, essas 12 canções conseguem revitalizar a sonoridade exuberante do “pop” sinfônico que Scott Walker fez em seus primeiros 4 discos. Já na primeira faixa fica claro que, ao trazer a Orquestra Metropolitana de Londres, conseguiram conquistar aquela musicalidade solta e artística do Reino Unido no final dos anos 60. É como ouvir um disco daquele período com um grande update: as vozes de Turner e Kane. Não são suaves e elaboradas como as de David Bowie e Scott Walker, são despretensiosas, harmoniosas e até um pouco infantil, o que separa o disco de algo cafona. Turner e Kane mantêm suas vozes um pouco mais recatadas em comparação com suas bandas originais, o que faz a dupla parecerem irmãos.

Cada vez que o drama das letras ameaça a se tornar algo muito monótono a dupla muda o tom do álbum com composições mais pesadas como “I Don’t Like You Anymore” que lembra bem o timbre mais rígido do Arctic Monkeys. Apesar de toda seriedade em cada aspecto do projeto, existe uma leveza distinta: as músicas são curtas o suficiente para não se cansar delas, mas são artísticas e satisfatórias o bastante para se tornar parte da sua coleção de discos que você, em um momento ou outro, sempre vai tirar da prateleira para ouvir.

Kane & Turner

 Para um disco gravado em duas semanas que é praticamente uma brincadeira e homenagem aos seus ídolos dos anos 60, The Last Shadow Puppets é uma conquista para se tirar o chapéu, uma reencarnação de uma linguagem musical atualmente arcaica. Existem rumores de que Noel Gallagher e Paul Weller estão gravando um disco juntos e uma coisa é certa: Os dois vão ter que trabalhar muito bem nas composições e arranjos dessa suposta parceria para chegar perto de The Age Of Understatement.

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